Toda vez que me
escondo, eu me acho. Por isso, não adianta enclausurar-me dentro do meu mundo
e, assim pensando, melhor sair por ai, andar por todas as províncias do “Reino
Caiçara”. E quando assim faço, as pessoas acenam-me e me fazem compreender que
sou muito conhecido e que estou inserido no cotidiano de um povo tão humilde e
sofrido. Amo demais este lugar e as pessoas que nele habitam, por isso, recebo
como gratidão, o reconhecimento de cada um deles.
Outro dia, sentado no banco de uma
praça qualquer, a fim de contemplar a natureza e o caminhar descompassados de
pessoas escravizadas pelos afazeres do dia a dia, pude observar um grupo
conversando próximo de mim. No calor das discussões, os interlocutores
queixavam-se dos serviços públicos. O descaso com a saúde, transporte,
segurança, educação, habitação, ruas descalças, inundações, estavam entre os
assuntos dissertados. Não faltavam adjetivos depreciativos ao Rei Fabrício e
aos membros do Parlamento (Câmara dos Lordes e Câmara dos Comuns). Até a
Suprema Corte era lembrada.
Por algum momento, quis aderir-me
ao grupo; mas, depois, preferi ficar onde estava e permanecer como observador.
É certo que minhas caminhadas pelo reino, sempre renderam grandes momentos e
histórias intermináveis. O cotidiano do reino, sempre nos agracia com fatos
trágicos ou pitorescos. Lá distante, num casa de pau a pique, uma música
sertaneja, tocava chorosamente, num rádio “Invicto”. Ora meus ouvidos se
atinham a musica, ora ao debate caloroso do grupo.
De repente, um dos mais afoitos,
durante aquela tertúlia, esbravejou: “Como pode! Meia dúzia de políticos meteram a
mão na burra do reino, saquearam algumas patadas e viajarem para o “Porto das
Penosas”. Um dos interlocutores, indagou: “Foram fazer o que lá?”. Intercedeu
um terceiro, ao que parece, mais informado: “Como o Monarca pretende instalar
uma granja e um abatedouro de galinhas aqui no reino, para consumo interno e,
também, para exportação, foram buscar informação e experiência, sobre o
empreendimento, num reino distante”.
Como no meio do grupo, havia um
radical, de língua afiada, já foi apimentando o debate: “Nada disso. Usaram o tal projeto
da granja, como pano de fundo, pois, na verdade, foram passar férias naquele
lugar paradisíaco. Comenta-se que levaram a família a tiracolo. Por que não
levaram um avicultor?”. Concordo plenamente com o radical do grupo. Por
que não se investir nas necessidades urgente do reino? As províncias estão
abandonadas e carentes de toda infraestrutura. O povo já morre de fome, imagina
as galinhas.
Uma plebeia revoltada impetrou uma
ação civil pública, junto a Suprema Corte, tentando impedir a viagem, mas, de
nada adiantou. É certo que a lei só é aplicada contra os pobres e desvalidos. O
que impera é a farra do boi, quando se fala do erário público, Assim foi no
reino anterior, quando, quem governava era uma rainha louca e insana. O
primeiro ministro daquele governo saqueou a monarquia e nada aconteceu. Hoje
ele goza de uma ostentação e escarneia os plebeus e os vassalos, a quem, um dia
ele governou. É a chamada santa impunidade, que muitos veneram.
Agora, os membros do Parlamento,
disfarçados de representantes do povo, estão usufruindo das mordomias, que o
cargo lhes proporciona, deliciando-se nas praias e nos resort de “Porto das
Penosas”. Enquanto isso, o povo – massa de manobra -, comem o pão que o diabo
amassou, para sobrevierem. Assim caminha a humanidade, abraçada com a
desumanidade de quem as governa. O povo, ora o povo!
Os parlamentares sacrificam as
penosas, para matarem suas fomes e matam o povo, para saciarem suas ganâncias.
Na realidade, eles não têm pena, nem mesmo de quem tem pena.
Peruíbe SP, 31
de outubro de 2017.
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